Leitura
Complementar: Salmo 33
Eis uma
história que parece bem distante, bem afastada de nosso dia-a-dia. O lugar dos
acontecimentos é o deserto. As personagens: o Espírito, Jesus, o diabo, os anjos.
Jesus, que jejua quarenta dias e quarenta noites; o diabo, que o tenta três
vezes; os anjos, que vêm servir a Jesus, depois de ele ter resistido ao
tentador. Nós perguntamos onde estas coisas sobrenaturais acontecem em nossa
vida? Que tem esta história a ver com nossa fé, nosso dia-a-dia, nossa luta?
Muito mais
do que você poderia pensar à primeira vista. Porque tudo o que acontece com
Jesus é importante para nós, para nossa fé, para nossa vida com Deus e os
homens. Se a história da tentação de Jesus só tivesse sido importante para o
próprio Filho de Deus, Mateus e Lucas não a teriam relatado em seus evangelhos.
Então seria um dos segredos que permanecem ocultos a ouvidos humanos, até o
fim dos tempos Mas o relato da tentação foi escrito, e foi escrito por nossa
causa. Ele contém uma mensagem de Deus para você e para mim, mensagem que nos
quer ajudar a vencermos a nossa própria tentação.
"Jesus
foi levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo". Quer
dizer que Jesus não foi enfrentar o tentador por própria conta. Ele não foi
por curiosidade para ver como é a experiência da tentação. Não fez como Adão
e Eva no Paraíso, que por iniciativa própria se aproximaram da árvore proibida
e que concluíram que a árvore era boa para se comer e que sua fruta era
agradável. Jesus foi levado pelo Espírito. O Espírito de Deus o conduzia, não
só no dia em que foi ao deserto para ser tentado, mas em cada dia de sua vida.
Nós oramos
no Pai Nosso: "Não nos deixes cair na tentação". Isso quer dizer: não
nos deixes cair na tentação desprevenidos, desarmados, indefesos, assim como
uma ovelha desprevenida cai nas garras do lobo. Guia-nos com teu Espírito para
que não caiamos. A nossa força nada faz; com ela estamos perdidos! Mas o
Espírito de Deus nos capacita a reconhecer o tentador, a descobrir as suas
intenções e a resistir a seu poder maligno.
O próprio
fato de Jesus ter sido tentado, igual a todos os filhos de Adão, é confortante
para nós. Prova que Jesus realmente veio para ser nosso irmão. Assim como ele,
o justo, entrou na fila dos pecadores, ao ser batizado no rio Jordão, assim
ele, também aqui, no deserto, se põe ao lado do homem desencaminhado, perdido
no deserto da tentação onde nenhuma criatura o auxilia, onde se acha entregue
ao ardil do demônio Verdadeiramente uma boa mensagem para você e para mim,
criaturas que vamos sendo tentados a cada dia de nossa vida. Nós temos a nosso
lado Jesus Cristo, nosso Salvador, tentado igual a nós, que obteve a vitória.
"Depois
de ter jejuado quarenta dias e quarenta noites, teve fome. O tentador,
aproximando-se dele, lhe disse: Se tu és o Filho de Deus, manda que estas
pedras se transformem em pão. Jesus respondeu: Não só de pão viverá o homem,
mas de toda a palavra que procede da boca de Deus". Se tu és o Filho de
Deus! O tentador não muda o seu modo de agir. Não troca de método, ao tentar o
homem. Ele começa sempre semeando a dúvida. "Será que Deus disse?"
Foi a mesma semente infernal que levou o "velho Adão" e toda a sua descendência
a comer do fruto proibido. Ele sabe bem: uma vez que consegue implantar a
dúvida no coração do homem, o resto será brincadeira. As ações más e perversas
sempre são consequência da "dúvida que pegou". São frutos da semente
do "será que Deus disse?".
E observamos
mais. O diabo ataca onde enxerga uma fraqueza do homem. Jesus tinha passado um
longo tempo sem se alimentar. Tinha fome. O tentador procura arrombar a porta
que lhe parece menos resistente. Ele é um senhor-psicólogo. Conhece os homens melhor
do que eles mesmos, quase tão bem como Deus. Quase! Deus nos conhece melhor,
louvado seja ele! Deus nos conhece com outras intenções. Ele nos ama!
A porta que
o tentador procurou arrombar em Jesus parecia fraca. Ele teve fome, fome igual
àquela que nós sentimos. Mas a porta estava guarnecida, estava protegida
Estava guarnecida pelo Espírito e pela palavra de Deus. Espírito e palavra de
Deus sempre andam lado a lado. Sim, mais do que isso: andam tão unidos que não
é possível separá-los. Assim Jesus não precisava pensar muito para saber como
ia resistir ao tentador. Ele respondeu com a palavra de Deus, respondeu com
uma citação da Bíblia: "Está escrito: Não só de pão viverá o homem, mas de
toda a palavra que procede da boca de Deus".
Jesus
conhecia a Bíblia. Mas não só a conhecia. Ele vivia da palavra de Deus. Vivia
dela como se vive de pão. Para resistirmos ao tentador, não basta conhecermos a
Bíblia. E preciso que nos alimentemos de toda a palavra que procede da boca de
Deus. Se não vivermos realmente da palavra de Deus, se não tivermos sede da
palavra, do evangelho, das promissões de Deus, então a porta de nossa casa está
desprotegida. Então o tentador vai rir das palavras bíblicas que lhe citarmos,
porque a Bíblia ele também conhece. E melhor do que nós, por certo. Ele tiraria
o primeiro lugar em qualquer concurso de conhecimentos bíblicos, sem sombra de
dúvida!
O tentador
dá provas de seus conhecimentos da Bíblia na segunda tentação. Levando Jesus
para o alto do templo lhe diz: "Se tu és o Filho de Deus, atira-te daí
abaixo, porque está escrito: Aos teus anjos ordenará a teu respeito que te
guardem; eles te susterão nas mãos para não tropeçares em alguma pedra".
Então, o diabo poderá tentar as pessoas, usando a própria Bíblia, como faz
aqui, citando o salmo 91! E será, por certo, o diabo mais perigoso o que vem
com a Bíblia na mão, com a boca transbordando de palavras da Escritura, e as
vai citando para dizer bem o contrário daquilo que Deus quer dizer! Porque a
Bíblia, como livro, não é capaz de se defender. Cada um pode fazer uso dela,
pode tirar palavras e frases do meio de outras para usá-las, assim como bem
entender. E mais uma vez Jesus responde ao diabo com a Bíblia. Responde guiado
pelo Espírito. Não entra naquela discussão estéril sobre a Bíblia, onde cada um
usa a Escritura como arma, citando-a para provar seu próprio ponto de vista.
Jesus cita a Bíblia como documento da vontade de Deus: "Também está
escrito: Não tentarás o Senhor, teu Deus". Jesus não duvida dos
conhecimentos bíblicos do diabo. Poderia ter dito que ele tinha citado mal,
porque no Salmo 91,11-12 diz que "os anjos te guardarão em todos os teus
caminhos". E saltar do templo, evidentemente, não é caminho. É coisa de
circo. Mas Jesus não entra nesta questão de explicação, de exegese, como dizem
os teólogos Ele cita a Bíblia conforme o Espírito o guia. Espírito e Bíblia
não se contradizem para Jesus. Assim o diabo descobre que também esta porta
está bem guardada pela palavra de Deus, revelada na Bíblia.
Quem somos
nós, para pensarmos que podemos dispensar a Bíblia? Que somos capazes de
defender-nos sem ela, confiados em nossa própria inteligência? Se o próprio
Jesus conhece a fundo a palavra de Deus, a tal ponto que vive dela como se vive
do pão, que suas palavras respiram a palavra da Bíblia? Que discípulos fracos
de Jesus somos nós, se nem soubermos responder a um dos numerosos apóstolos da
confusão religiosa, que hoje andam pelo mundo, muitas vezes com a Bíblia na
mão! Aprendamos de Jesus a amar este livro, a cavar fundo nele. Não vamos
deixar de descobrir água viva, se nos dermos o trabalho de cavar. E de água
viva nós precisamos, neste mundo seco e estéril em que vivemos.
"E
outra vez o diabo o levou a um monte muito alto, mostrou-lhe todos os reinos do
mundo e sua glória e lhe disse: Tudo isto te darei, se prostrado, me
adorares". Jesus lhe disse: "Retira-te de mim, Satanás. Porque está
escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás e só a ele darás culto".
Agora o
tentador deixa a psicologia de lado. Põe as cartas na mesa. Vem com uma
proposta maciça. Oferece poder, poder sobre o mundo inteiro. Claro que as
cartas são falsas. O diabo é mentiroso desde o início. O que ele oferece é um
cheque sem fundo. Procura vender uma coisa que não é dele. Porque a terra não é
do diabo. A terra é de Deus. Apesar de tudo. Apesar das experiências em
contrário. A própria palavra de Deus o diz: "A terra é do Senhor, e tudo o
que ela contém" (Salmo 24,1). Também neste caso Jesus não começa a
argumentar com o diabo, procurando apontar-lhe o seu erro, as suas cartas
falsas. Com o diabo não se argumenta. Ele só respeita uma atitude: sim ou não.
Se o "não" é claro, dito no poder do Espírito, então é o que basta. "Está
escrito: Ao Senhor, teu Deus, adorarás e só a ele servirás". Jesus também
põe as cartas na mesa. Assim como ele tinha feito nas outras tentações. Não
deixa nenhuma margem de dúvida: "Retira-te, Satanás". Esta é a
linguagem que o diabo compreende Jesus indica para seu único ponto de
referência: para Deus, bem assim como fizera nas primeiras tentações Para o
Deus que é seu Pai e ao qual ele quer servir.
Dizem que
cada homem tem o seu preço. Que é apenas uma questão de se oferecer a soma
exata para dobrar o mais honesto dos homens. Pode ser que para o velho Adão
isso confira. Mas Jesus é o novo Adão. Ele não tem preço. Ele é o Filho de
Deus. Não só de nome, mas de verdade. Sua comunhão com o Pai é tão firme, que
nada é capaz de a pôr em dúvida. Nós temos um Salvador poderoso, "tentado
em todas as coisas, igual a nós, mas sem pecado" (Hebreus 4,15). Ele é o
nosso baluarte, nossa defesa na hora em que o poder do maligno nos ameaçar.
"Então
o diabo o deixou. E eis que vieram os anjos e o serviram". Não vamos
tratar de imaginar como foi que os anjos serviram a Jesus, depois de o tentador
o ter deixado. Vamos louvar a Deus porque, além do demônio e seus poderes maus,
existem outros poderes, os anjos. Poderes invisíveis, criaturas santas e
obedientes, totalmente sintonizadas com a vontade do Criador.
A Bíblia
costuma ser muito reservada, quando fala de anjos. Não diz qual é a aparência
deles. Mas os anjos são parte integrante do evangelho. E é algo muito confortador sabermos que Jesus, depois das tentações infernais que vieram sobre ele, recebe
o conforto dos anjos. Nós ouvimos há pouco que tudo o que acontece com Jesus é
importante também para o cristão. Saiba, pois, que os anjos de Deus também
estão perto de você, que eles, não os demônios são os poderes que definem a
vida normal do cristão. Louvado seja Deus, por nos ter dado a vitória em Jesus
Cristo.
Oremos: Deus
e Pai. Tu nos dás comunhão de vida com teu Filho amado. Pela fé somos ligados a
ele, e por meio dele, a ti, nosso Pai. Graças te damos por não precisarmos
lutar sozinhos contra os poderes das trevas. Graças te damos porque a vitória
de Jesus é também a nossa vitória. Amém.