Poucas passagens existem, nos quatro evangelhos, que sejam mais importantes do que esta. Há poucos trechos bíblicos que contenham, em tão poucos versículos, tantas e tão preciosas verdades. Que Deus nos dê olhos para ver e coração para apreciar o grande valor destas verdades!
Em primeiro lugar, aprendemos quão excelente é a atitude mental de ser simples e despretensioso como uma criança, e estar pronto a receber a instrução. Em oração, nosso Senhor disse a Deus Pai: "Ocultaste estas cousas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos".
Não nos compete tentar explicar por que razão alguns recebem e crêem no evangelho, enquanto outros não o fazem. A soberania de Deus quanto a isso é um profundo mistério, de maneira que não somos capazes de sondá-la. Mas, seja como for, há algo na Bíblia que se destaca como uma grande verdade prática, e da qual jamais nos deveríamos esquecer. O evangelho geralmente está oculto daqueles que são "sábios a seus próprios olhos, e prudentes em seu próprio conceito" (Is 5.21). O evangelho geralmente é revelado aos humildes e despretensiosos, que estão dispostos a aprender. As palavras da virgem Maria estão se cumprindo constantemente: "Encheu de bens os famintos, e despediu vazios os ricos" (Lc 1.53).
Vigiemos nosso coração quanto ao orgulho, em todas as suas manifestações — o orgulho intelectual, o orgulho das riquezas, o orgulho em face de nossa própria bondade, o orgulho de nossos próprios méritos. Coisa alguma tende por manter um homem fora do céu, impedindo-o de ver a Cristo, mais do que o orgulho. Enquanto imaginarmos que somos alguma coisa, jamais seremos salvos. Oremos pedindo humildade, e então a cultivemos. Procuremos conhecer a nós mesmos de maneira correia, descobrindo a nossa verdadeira condição diante de um Deus santo. O início do caminho para o céu é quando sentimos que estamos no caminho do inferno, e então nos dispomos a ser ensinados pelo Espírito Santo. Um dos primeiros passos no caminho da salvação é perguntar, como fez Saulo de Tarso: "Que farei, Senhor?" (At 22.10). Dificilmente há outra afirmação de nosso Senhor que seja tão frequentemente repetida quanto esta: "...o que se exalta, será humilhado; mas o que se humilha, será exaltado" (Lc 18.14).
Em segundo lugar, aprendamos, com base nestes versículos, a grandiosidade e a majestade de nosso Senhor Jesus Cristo. A linguagem de nosso Senhor quanto a este assunto é profunda e maravilhosa. Disse Ele: "Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho senão o Pai; e ninguém conhece o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar". Ao ler estes versículos, bem podemos dizer: "Tal conhecimento é maravilhoso demais para mim: é sobremodo elevado, não o posso atingir". Podemos vislumbrar um pouco da perfeita união existente entre a primeira e a segunda pessoa da Trindade. Vemos algo da incomensurável superioridade do Senhor Jesus, sobre todos os que não passam de meros homens. Não obstante, depois de havermos dito tudo isso, devemos confessar que existem alturas e profundidades neste versículo, que estão muito além da nossa débil compreensão. Podemos apenas admirá-las no espírito de crianças pequenas. Contudo, ainda assim, sentimos que metade dessas coisas jamais se contou ao mortal.
Entretanto, que nós vejamos nestas palavras de Jesus a grande verdade prática de que todo poder e autoridade, em tudo quanto diz respeito à salvação de nossas almas, está nas mãos de nosso Senhor Jesus Cristo. "Tudo me foi entregue por meu Pai." Ele tem a chave. Para ir ao céu, precisamos ir até Ele. Ele é a porta: precisamos entrar por intermédio dEle. Ele é o pastor das ovelhas: precisamos ouvir a Sua voz e segui-Lo, se não quisermos perecer no deserto. Ele é o médico das almas: precisamos consultá-lo, se quisermos ser curados da praga do pecado. Ele é o pão da vida: precisamos nos alimentar dEle, se quisermos que as nossas almas sejam satisfeitas. Ele é a luz: devemos andar após Ele, se não nos quisermos desviar para as trevas. Ele é a fonte da vida: precisamos lavar-nos no seu sangue, se quisermos ser purificados e preparados para o grande dia da prestação de contas. Benditas e gloriosas são estas verdades! Se temos a Cristo, temos todas as coisas (l Co 3.22).
Em terceiro lugar, com base nesta passagem, aprendemos como é amplo e pleno o convite do evangelho de Cristo. Os últimos três versículos do capítulo, que encerram essa lição, são realmente preciosos. Eles vêm ao encontro do trêmulo pecador, que indaga: "Cristo revela o amor do Pai para alguém como eu?" Estes versos são um precioso encorajamento, e merecem ser lidos com especial atenção. Por quase dois mil anos eles têm sido uma bênção para o mundo, e têm beneficiado a milhões de pessoas. Não há uma única sentença, nestes versículos, que não contenha preciosos pensamentos.
Observe quem são aqueles a quem Jesus convida. Ele não se dirige àqueles que se sentem justos e dignos em si mesmos. Ao contrário, dirige-se a "todos os que estais cansados e sobrecarregados". Essa é uma descrição bastante ampla. Abrange multidões neste mundo cansativo. Todos os que sentem um peso no coração, todos quantos desejam tornar-se livres de alguma carga do pecado, de alguma carga de tristeza, de alguma carga de ansiedade ou de remorso — todos estão convidados a virem a Cristo, não importa quem sejam ou o que já tenham sido na vida.
Note, em seguida, a graciosa oferta que Jesus faz. "Eu vos aliviarei... e achareis descanso para as vossas almas." Quão animadoras e confortantes são tais palavras! A falta de tranquilidade é uma das grandes características do mundo. A pressa, o vexame, o fracasso e os desapontamentos nos confrontam por todos os lados. Mas há esperança. Existe uma arca de refúgio para o cansado, tal como houve para a pomba solta por Noé. Em Cristo encontramos descanso — descanso para a consciência e para o coração, descanso fundamentado no perdão de todo pecado, descanso que é resultado da paz com Deus.
Veja quão simples é o pedido que Jesus faz aos que estão cansados e sobrecarregados. "Vinde a mim... tomai sobre vós o meu jugo... aprendei de mim..." Jesus não interpôs nenhuma condição difícil de ser atendida. Ele nada fala sobre obras a serem realizadas, ou de merecimentos, para que alguém possa receber os seus dons. Ele somente nos pede para irmos até Ele como estamos, com todos os nossos pecados, entregando-nos aos seus cuidados, como criancinhas dispostas a receber o seu ensino. É como se Jesus dissesse: "Não busqueis alívio nos homens. Não espereis que vos apareça alguma ajuda, vinda de outra direção. Tais e quais sois, neste mesmo dia, vinde a mim".
Observe, igualmente, quão encorajadora descrição Jesus faz de si mesmo. Ele diz: "Sou manso e humilde de coração". Quão verazes são essas palavras é algo que todos os santos de Deus têm frequente-mente experimentado. Maria e Marta, em Betânia, Pedro após a sua queda, os discípulos após a ressurreição, Tomé depois de sua fria incredulidade — todos eles provaram da "humildade e gentileza de Cristo". Este é o único lugar em toda a Escritura, onde se faz menção ao "coração” de Jesus. Esta é uma declaração que nunca deveríamos esquecer.
Em último lugar, observe a encorajadora consideração que Jesus dá ao serviço prestado a Ele. Ele diz: "O meu jugo é suave e o meu fardo é leve". Sem dúvida que existe uma cruz para ser carregada se seguimos a Cristo. Indubitavelmente existem provações e testes a serem enfrentados, e batalhas a serem travadas. Mas, os consolos do evangelho ultrapassam em muito o peso da cruz. Comparado com o serviço ao mundo e ao pecado, comparado com o jugo das cerimônias judaicas e com a escravidão às superstições humanas, o serviço prestado a Cristo é muitas vezes mais leve e fácil. O jugo de Cristo não é carga maior do que as penas o são para a ave que as possui. Os mandamentos de Cristo "não são penosos" (1 Jo 5.3). "Os seus caminhos são caminhos deliciosos,e todas as suas veredas paz" (Pv 3.17).
Agora vem a solene pergunta: Já aceitamos, pessoalmente, esse convite? Acaso, não temos pecados a serem perdoados e nem tristezas a serem removidas? nem feridas de consciência a serem saradas? Se temos, ouçamos atentamente a voz de Jesus Cristo. Ele fala conosco como falou aos judeus. "Vinde a mim..." Esta é a chave para a verdadeira felicidade. Eis o segredo de ter um coração leve. Tudo depende e gira em torno da aceitação desta oferta que Cristo faz.
Que jamais estejamos satisfeitos, enquanto não soubermos e sentirmos que já fomos a Cristo pela fé, buscando nEle o descanso, e que cada dia estamos indo até Ele em busca de novos suprimentos da graça divina! Se fomos até Ele, aprendamos a nos apegar a Ele ainda mais intimamente. Mas, se ainda não fomos até Ele, então que o façamos agora mesmo. A palavra de Cristo jamais falhará: "O que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora" (Jo 6.37).
Autor: J. C. Ryle
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