A prática da vontade é a arte de gerir o dom do livre-arbítrio com inteligência, responsabilidade e acerto, submetendo cada desejo ao crivo da exaltação do nome de Deus, na certeza de que Ele pedirá conta de todas as coisas.
O homem não se dirige apenas por instinto, mas por livre escolha. Nesse sentido, ele é imagem e semelhança de Deus. A vontade faz parte da natureza humana e é algo imprescindível: a vontade de viver, a vontade de trabalhar, a vontade de amar, a vontade de dar, a vontade de ser bem-sucedido, a vontade de agradar a Deus, e até mesmo a vontade de "deixar esta vida e estar com Cristo" (Fp 1.23, BLH). O dom da vontade, outorgado por Deus, facilita muito a vida, torna tudo agradável e transfere uma dose enorme de responsabilidade ao indivíduo.
VONTADES CONTRADITÓRIAS
O homem tem simultânea ou sucessivamente vontades opostas entre si. Ele tem uma vontade agora e outra depois, ou ambas ao mesmo tempo. Do ponto de vista teológico, ele é dominado por duas vontades igualmente fortes: a vontade de acertar e a vontade de errar.
1. A vontade de acertar
É a vontade de rejeitar o mal e abraçar o bem. É a vontade de levar a sério o Decálogo, o Sermão da Montanha e a santidade de vida. É a vontade de obedecer, de amar a Deus de todo o coração, de agradar a Deus, de negar-se a si mesmo dia a dia, de crucificar a carne, de andar no Espírito, de não arredar o pé do caminho apertado, que conduz à vida. Não obstante nobre, essa vontade encontra sérios obstáculos.
O primeiro obstáculo é a pecaminosidade latente, fruto da queda. O homem carrega consigo, no mais interior de seu ser, esse fardo incômodo, do nascimento à morte. É por essa razão que Jesus explicou: "O que sai da pessoa é o que a faz impura" (Mc 7.20, BLH). Daí a descoberta de Paulo: "O pecado que habita em mim" (Rm 7.20).
O segundo é a estrutura pecaminosa da cultura ou da sociedade no meio da qual se vive: "Tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai. mas procede do mundo" (l Jo2.l6).
O terceiro é a atuação das forças espirituais do mal: "O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar" (l Pe 5.8). Os três obstáculos aparecem juntos na Epístola de Paulo aos Efésios: o curso deste mundo, o príncipe da potestade do ar e as inclinações da carne (Ef 2.1-3).
2. A vontade de errar
É a vontade de satisfazer os desejos da carne, de andar segundo o curso deste mundo, segundo a liderança do mal. Essa vontade de errar também encontra sérios obstáculos, especialmente quando a pessoa é educada no temor do Senhor e comprometida com Jesus Cristo.
O maior de todos os obstáculos é a atuação do Espírito Santo na vida do crente: "O Espírito milita contra a carne" (Gl 5.17). Uma porção de outros elementos se juntam ao Espírito no afã de dificultar e impedir a realização da vontade de errar. Entre eles estão a noção da santidade de Deus, o não-conformismo da nova natureza implantada pela educação religiosa e em virtude da regeneração, os compromissos anteriormente assumidos com a luz, a consciência devidamente alimentada, a visão mais profunda e mais sábia da vida, a lembrança das miragens e frustrações anteriores, o patrimônio moral e espiritual até então acumulado, a repreensão da igreja e dos irmãos e o temor do castigo da desobediência.
VONTADE ALHEIA
Da infância ao fim de seus dias, o homem está sujeito à vontade alheia e dela recebe constante e forte bombardeio. A vontade alheia usa desde a propaganda subliminar até a propaganda ostensiva: a literatura e as artes, o discurso e a persuasão, a insistência e a saturação, a mentira e o engano, a chantagem e a manipulação. Todavia, a decisão final está no exercício da vontade própria.
A vontade própria é tão determinante que tanto o bem como o mal a respeitam e tentam atraí-la e dobrá-la. No Éden, tanto Deus como a serpente respeitavam a vontade da mulher. Deus não pôs uma grade em torno da árvore da ciência do bem e do mal, nem a serpente enfiou o fruto proibido na boca da mulher. Foi ela quem tomou o fruto e o comeu (Gn 3.6). A vontade própria é uma barreira tremenda ora para as forças do mal ora para as forças do bem.
A ESCOLHA FINAL
De um lado, há a vontade de provar o fruto proibido, a vontade de deitar com a mulher de Urias, a vontade de ser amada pelo marido de outra mulher, a vontade de furtar uma barra de ouro, a vontade de não levar desaforo para casa, a vontade de não repartir coisa alguma, a vontade de ajuntar tesouros exclusivamente sobre a terra, a vontade de espalhar uma informação mentirosa, a vontade de matar o desafeto. De outro lado, há a vontade de pagar o mal com o bem, a vontade de ser sal da terra e luz do mundo, a vontade de ser limpo de coração, a vontade de crucificar o eu e espancar a carne, a vontade de seguir a Jesus até à prisão ou até à morte, a vontade de evangelizar, a vontade de distribuir todos os bens com os pobres. No meio dessas vontades fortes e opostas está o dom do livre-arbítrio.
A VONTADE DE DEUS
A única maneira de não satisfazer a vontade alheia, a concupiscência da carne, o curso deste mundo que jaz no maligno e as insinuações dos demônios é fazer um alinhamento da vontade própria com "a boa, agradável e perfeita vontade de Deus" (Rm 12.2). Então o resultado será "amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio" (Gl 5.22, 23).
Autor: Elben M. L. Cesar
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