Alguns adoram, alguns duvidam, um já tinha caído fora: a situação
da igreja dos apóstolos não era muito diferente da nossa. Uma igreja perfeita,
na qual tivessem vivido só crentes e santos, nunca existiu. Os apóstolos eram
homens sujeitos às mesmas falhas e às mesmas fraquezas que nos perturbam hoje.
Bem poderíamos imaginar que Jesus tivesse feito um sermão para eles, nos
seguintes termos: "Olhem, meus discípulos, se as coisas vão continuar
deste jeito, vocês não vão longe. A união é que faz a força. Nós começamos com
doze, e agora já falta um. E, neste momento, alguns de vocês estão duvidando.
Entre vocês não pode haver nenhuma dúvida! Se os homens vão notar que vocês, meus
discípulos, têm problemas de fé, como é que o evangelho irá conquistar o
mundo...?"
Mas o que Jesus faz é algo bem diferente. Ele, o Senhor
ressurgido, o Filho de Deus glorificado, ele se aproxima deste grupinho de
homens, nos quais se misturam a fé e a descrença, e desvia o olhar deles da
própria fraqueza para seu poderoso Senhor: "Toda a autoridade me foi dada
no céu e na terra". Toda a autoridade! Não só um pouco. Não um poder
limitado. Nenhuma autoridade parcial reservada à Galileia, à Palestina, ao
Império Romano à civilização ocidental, à sociedade dos brancos. A autoridade
de Jesus abrange toda a terra. E ela abrange o céu também. Assim, sua igreja
não será nunca uma "sociedade limitada". E não será nunca uma
"sociedade anônima , tampouco. Ela tem nome, nome insubstituível,
nome santo e eterno: Igreja de Jesus Cristo. Será que nós, os luteranos, os
presbiterianos, os católicos, e todos os outros cristãos, não corremos todos o
perigo de esquecermos isso? Que só a igreja de Jesus Cristo, ao qual foi dada toda
a autoridade, tem a promissão de vencer as portas do inferno? É um lembrete
contra qualquer tipo de sectarismo, seja ou não seja etiquetado com o nome de
"igreja".
As palavras que Jesus dirige às primeiras comunidades são tão
importantes para qualquer comunidade cristã, sim, para toda a cristandade, que
deveriam ser o farol, o ponto de referência, em que nos orientamos em qualquer
situação e em qualquer emergência de nossa vida cristã. A Jesus Cristo, nosso
Senhor, foi dada toda a autoridade, no céu e na terra. Portanto vamos olhar
para ele, não para nós. Vamos orientar-nos em seu poder, não em nossa fraqueza.
Não vamos assustar-nos dos poderes a das .dificuldades que se vão levantar em
nosso caminho. Não vamos orientar-nos em problemas. Problemas são para ser
enfrentados, para ser vencidos, mas não servem para orientar. Quem tentar
orientar-se em problemas - no problema social, na crise econômica em problemas
de vida e de fé - esse acaba ficando desorientado, acaba sendo um problema ele
mesmo (como, aliás, sempre foi). Como ponto de orientação só serve um lugar: é
o lugar onde Jesus está. E Jesus não é só para ser olhado em atitude meditativa
e respeitosa, ele é para ser ouvido e obedecido. É sua palavra que nos orienta,
que nos guia e que nos põe em movimento.
Se a cristandade sempre tivesse levado a sério esta declaração
básica de Jesus, "A mim foi dada toda a autoridade", então não teria
havido lutas de poder, separações, rivalidades ou qualquer outra crise de
autoridade, no povo de Jesus. A miséria dos cristão começa no momento em que
eles deixam de contar com o poder exclusivo e ilimitado de seu Senhor, no
momento em que eles olham para o lado, para ver, se não há um lugarzinho mais
seguro para se refugiar uma pessoa mais influente à qual recorrer. Se
pudéssemos desviar o nosso olhar de tudo e de todos, inclusive de nós mesmos,
olhando com fé simples e ingênua para Cristo, o Senhor, aí poderíamos dispensar
as muletas que nós mesmos fabricamos. Poderíamos vencer nossas crises de
autoridade, nosso cansaço, nossa tristeza, nossa preguiça. Ouviríamos simplesmente
a mensagem e obedeceríamos. Enfrentaríamos sem medo os problemas de nosso
tempo, confiados exclusivamente no poder e na autoridade de Cristo. O que nos
impede, aliás, de fazer isto mesmo?
"Ide portanto, fazei discípulos de todas as nações,
batizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a
guardar tudo o que vos tenho ensinado". Como se faz um discípulo?
"Indo", diz Jesus. Não é, pois, ficando no lugar onde estamos, entrincheirados em nossa tradição, para ver se os futuros discípulos virão a
nós. Não há nenhuma escola de discípulos localizada em Jerusalém (ou em São
Paulo, ou São Leopoldo...). E verdade: numa escola pode acontecer o milagre de
se fazer um discípulo; mas tal milagre não pode ser parte de um programa, de um
currículo de colégio, nem de seminário ou Faculdade de Teologia. "Ide,
portanto", diz Jesus. Você reparou na palavra "portanto"? O que
ela significa? Significa algo essencial. Vou usar de uma comparação: você
conhece um cortador de grama elétrico? Se não conhece, pode imaginar. A gente
vai levando o cortador pelo gramado, e ele vai conosco. Vai cortando enquanto o levamos. Enquanto ele estiver ligado pelo fio elétrico à tomada de força, ele
vai cortando grama. Se desligarmos o fio, a lâmina cortadora para. Aí você pode
empurrar o quanto quiser. Verá que esta máquina não foi feita para funcionar
sem eletricidade. Pois bem, eu afirmo que a palavra "portanto" é o
tal fio que liga a máquina à rede elétrica: "A mim foi dada toda a
autoridade". Isto é a força. "Portanto": isto é o fio. "Ide
fazei discípulos": isso é o cortador de grama que se movimenta na função
para a qual foi feito. Se você esquecer este "portanto", vai ser um
cristão frustrado. Um cristão emperrado, um cristão que empurra e que se
desanima. Com outras palavras: Cristo nos manda ao mundo não como alguém que
quer ficar por aí, só para olhar. "A mim foi dada toda a autoridade.
Portanto ide". Isso é: vocês vão ser movidos pelo meu poder. Irão
revestidos de minha autoridade. Eu sou o que faz andar o evangelho. Permaneçam
ligados a mim. Permaneçam em mim! Ide! "Portanto, portanto": Você
nota como esta palavra começa a ter peso? "Eu tenho poder - portanto, vai!
Portanto põe mãos à obra, vai para a frente com esta tarefa espinhosa. Abre a
boca e fala de meu evangelho" Sim, estas palavrinhas pequenas muitas vezes são muito importantes na Bíblia. É como no Salmo 46: "Deus é nosso
refúgio e fortaleza... portanto não temeremos". Você já sabe o segredo
deste portanto? Poderá ser essencial para você e para os que Deus pôs a seu
lado.
Fazer discípulos, batizando-os em nome de Deus Pai, Filho e
Espírito Santo, e ensinando o que Jesus ensinou: É esta a tarefa que Jesus dá
aos seus discípulos. Uma tarefa baseada no "portanto" do qual falamos.
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